segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

84 – Quase...

  Enfim, consegui colocar tudo para fora a respeito de meu país para o estrangeiro, ele ficou muito incrédulo, tanto que eu até fiquei inseguro se eu não estava exagerando. De qualquer maneira eu falei pra caramba. Momentos como esses não têm preço, a de exercitar as habilidades desenvolvidas, no caso, italiano. O tempo estava andando e os assuntos se acabando e inevitavelmente tive que ir.

 – Bem, creio que está na hora de eu andar. Você vai me ligar para agendar aqueles vídeos?

 – Sim pode deixar Fabriciu, eu entrarei em contato com você em breve e pode deixar que vou ver em meu local de trabalho se tem vaga para você.

 – Combinado e muito obrigado. Tenha uma boa noite.

 Se quando cheguei não tinha quase ninguém nas ruas, depois então é que tudo virou um deserto, eu não tinha a menor noção do tempo e instintivamente apertei o passo, não queria acordar ninguém. Lá na casa eu acho que não havia chave, sempre tinha alguém lá dentro para abrir a porta, para ser sincero eu acredito que aquela fechadura jamais foi usada, eu mesmo nunca tranquei a porta e nunca vi ninguém trancando também. Uma vez cheguei lá e não tinha ninguém e a porta estava destravada, fiquei lá fora esperando alguém abrir o portão que dá na rua e depois esperei alguém abrir o segundo portão do prédio, já que vivia em um condomínio e sempre tinha gente entrando e saindo. Por incrível que pareça, naquela noite, eu não precisei apertar o interfone para abrirem as portas, fui apenas entrando. Quando cheguei no corredor que vai dar na porta de entrada do apartamento vi que estava saindo Consuelo, totalmente bêbada, ela olha para mim e dá um leve sorriso.

 – Ah! Fabriciu! Onde estavas?

 – Olá Consuelo! Eu estava na casa de uns amigos.

 – Que bom te ver aqui...

 Aí ela veio em minha direção e me abraçou, deu alguns resmungos com o rosto debruçado em meu ombro, na realidade ela estava se apoiando em mim de tão bêbada que estava. Eu fiquei ali meio sem jeito, notoriamente estava desconfortável com a situação, eu tentava afastá-la de mim, nunca tinha passado por uma situação dessas. Dali a pouco saiu da porta do apartamento o meu amigo Marcos, ele ficou um tempo olhando com uma garrafa de cerveja na mão até Consuelo dar-se conta de que ele estava presente, parece que instintivamente Consuelo estava tentando disfarçar.

 – O que foi? Não. Não tem ninguém aqui... Como? ... Não sei. Vá embora...

 Consuelo brigava com ninguém no portão de entrada do prédio sentido em que Marcos não conseguia ver na posição ao lado da porta onde ele se encontrava. Ele então entrou de volta para o apartamento. Consuelo cansada resolveu se despedir de mim e foi embora também. – Ufa! – Entrei logo em seguida. Marcos me viu e inesperadamente se derramou em lágrimas me abraçando também.

 – Eu não agüento mais essa situação. Que droga de vida. Que droga de cerveja. Que droga de tudo.

 – Caramba, o que estava acontecendo aqui? – Fiquei pensando comigo sem entender nada. – Será que Marcos gosta de Consuelo? Ele estaria chorando por ela? Afinal ele saiu do apartamento para procurá-la. Ele pode ter saído atrás dela. – Esses pensamentos ficavam martelando em minha cabeça e agora ele estava ali chorando no ombro de seu algoz. Claro, isso era apenas uma hipótese, outra hipótese era que ele estava de saco cheio de ficar enchendo a cara, de não encontrar trabalho e não ter dinheiro para nada e viu em mim alguém para desabafar.

 – Sabe Fabriciu, outro dia eu estava precisando de dinheiro para ligar para minha casa na Bolívia, ninguém tinha para me emprestar, e hoje eu fui ali ao lado, na casa do Conan, e ele me convidou para beber cerveja, ou seja, dinheiro para eu chamar a minha casa não tem, mas bebida tem a vontade.

 Ele me contava derramando lágrimas inconsoladamente, e o pior é que ele tinha razão.

 – Não fique assim Marcos. Olha só, eu tenho aqui um cartão de telefone. Tome vá chamar a sua casa. Não sei se restaram muitos créditos. Acho que dá para dar um alô rápido.

 Toda aquela confusão me deixou sem palavras, não sabia o que dizer para ele, só me restava, para consolá-lo, solucionar um problema parcial que ele me apresentou, desconsiderando aí a hipótese sobre ele e Consuelo ou qualquer outra que porventura houver. Aquele cartão eu tinha desde que pus os pés na Itália e me serviu para tantas coisas, para enviar mensagem eletrônica para o Brasil, para ligar tantas vezes a Alex em busca de novidades sobre o trabalho para estacionar ônibus e até mesmo para chamar Elizabeth algumas vezes. O engraçado foi a cena dele pegando já consolado com lágrimas nos olhos e saindo para usar, eu me senti péssimo, ele estava precisando era de palavras de ânimo, de apoio, de qualquer forma ele poderia obter isso de sua casa. Poderia se tivesse crédito suficiente no cartão, o que não deveria ter. São situações dessas que devem ser lembradas para nunca mais serem repetidas, eu espero que assim seja.

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