sábado, 7 de outubro de 2006

34 – Como vai o italiano?

Este foi um dos dias mais intenso em contato direto com o idioma local, pelo menos no que diz respeito a perguntas e explicações de localização estou craque, ao ponto de me sentir confiante em crer que “tava tudo dominado”. Sem noção, isso sim.
Na casa, quando cheguei à noite, todos já sabiam de minha viagem e estavam curiosos, punham muita fé em mim, me davam força mesmo. Em comparação aos desempregados até que se podia dizer que eu era uma esperança, afinal todos passavam o dia inteiro parados, não se moviam, nem beber podiam por falta de dinheiro. Não era fácil, ninguém ali tinha documentos e não poderiam preencher ficha nas porcarias das agências de emprego, nem se expor muito, com aquela aparência de forasteiro era fácil chamar a atenção dos carabinieris. Se for para comparar com a situação de seu país eles estavam melhor, mesmo parados. Marcos ficou sabendo também e logo veio dizendo que se eu tivesse dito a ele antes teria me indicado um monte de lugares para ir, além de comer, me disse que conhecia sete lugares diferentes para se comer de graça em Milão. Antes de ir para Bérgamo ele estava lá e por isso conhecia muito bem tudo. Podia até ser verdade, mas achei melhor não arriscar, ele já havia me dito sobre esses detalhes antes. Em cima no quarto brinquei com a Mercedes e Estela como de costume, se bem que as brincadeiras vinham diminuindo desde o último final de semana depois de todos aqueles foras que Mercedes tinha dado e os ataques a David e Sandra vinham se acentuando, fora a barulheira que ela fazia para atrapalhar o sono de quem trabalhava, ainda era cedo para se enfadar daquilo.
Novo dia. Está na hora de planejar o que farei hoje. Já sei, tenho que voltar para a Comune para transferir minha residência. Será que quase uma semana depois que estive lá eu vou conseguir entendê-los dessa vez? O excesso de confiança é uma faca de dois gumes, se a decepção é muito grande pode levar a pessoa até à desistência. A minha sorte é que dessa vez me levaram para uma funcionária que é exceção naquele país. Calma, atenciosa, educada, interessada, tantas qualidades numa funcionária só, se eu não tivesse visto com meus próprios olhos não acreditaria que existiria qualquer trabalhador nato lá assim, pelo menos na região norte. Desconfio que ela seja estagiária, teve muita paciência comigo e preocupação de que eu entendesse a burocracia de lá, consultava todo mundo e no final colocou meu nome no sistema com o endereço da via Quarenghi. Parecia que ninguém daquela cidade jamais tinha feito uma transferência de residência de um estrangeiro antes, eles quiseram saber a origem do meu antepassado que originou o processo de cidadania para buscar os dados na Comune da cidade dele. Parecia que tudo tinha se resolvido, eu teria que ficar esperando um fiscal ir na casa para confirmar a minha residência lá. Essa transferência era necessária para eu poder arrumar um visto de moradia para minha esposa depois que eu encontrasse um emprego e pudesse ir busca-los. Esse episódio ficou comprovado que faltava muito chão ainda para eu dominar 10% da língua, graças à improvável paciência daquela moça eu consegui entender algumas coisas, mas tudo por dedução e exclusão.
Embalado pelo aquecimento fui procurar o padre Estéfano, não muito longe da via Quarenghi, pelo fato de morar no centro da cidade era tudo muito perto para mim, chegando lá tive sorte, ele estava atendendo, a secretária dele era uma senhora muito boa gente, antes de pensarem que era outra exceção ela era africana, se bem que nas igrejas as pessoas costumavam ser mais calorosas, nem sempre. Tinha só um grupo conversando com o padre e logo fui eu. Expliquei a ele minha situação e ele disse que havia um curso profissionalizante para me inscrever e precisava de meu “códice fiscale” (se lê coditche), esse código era o equivalente do CPF brasileiro. Nem sabia o que era aquilo e ele me instruiu em como conseguir um, tudo em italiano.

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