sábado, 25 de novembro de 2006

74 – Última sexta-feira do curso.

No último dia útil daquela semana estava agendada a visita de um advogado para explicar sobre as leis trabalhistas da Itália. Era um jovem rapaz que trabalhava ali na escola mesmo, acredito que estava fazendo estágio ou fazia estágio em Milão ou ainda estudava direito em Milão e trabalhava na escola, bem, só sei que ele mostrou o livro da constituição italiana (http://www.senato.it/documenti/repository/costituzione.pdf), não tinha mais de 50 páginas, fininho que até doía. Naquele dia eu fiquei muito impressionado com o tamanho da composição. Deve-se levar em consideração o fato de eu ser totalmente leigo nessa área de direito, para mim o livro onde estava a nossa (http://www.siope.inep.gov.br/arquivos/leis/1988.pdf) era enorme. Lembro-me das piadinhas que se fazia em 1988 principalmente o programa que o Jô Soares tinha na rede Globo. Naquela época, ele colocava esquetes sobre a utilidade do livro no cotidiano do povo brasileiro. Em uma delas explicava que era útil para anão subir em cima e poder alcançar o telefone nos orelhões, em outra ele demonstrava a utilidade do livro para calçar mesa que tinham as pernas desniveladas, então aquelas imagens ficaram gravadas na minha memória como se o livro fosse grande. Acabei informando equivocadamente o palestrante sobre a desproporção do tamanho entre nossas constituições, mesmo com a ênfase que dei no suposto disparate ele não me pareceu convencido, acabou se revelando um profissional pragmático.

Foi uma manhã de sexta-feira movimentada aquela, depois da palestra fomos a outra sala para assistir a um vídeo, era sobre uma máquina fresadora programável de última geração. O povo italiano tem uma tradição muito grande focada no trabalho, pode-se chamar de cultura do trabalho. Para eles esse é o único caminho de se construir um país. Pelo menos é assim no norte onde pude presenciar pessoalmente. – Mas que obviedade é essa que ele está me contando? – deve ser a pergunta que muitos estão se fazendo nesse momento. Uma coisa é ter ouvido falar, escutado na escola alguma coisa semelhante, outra é vivenciar essa teoria na prática. Um exemplo clássico era a demonstração de disponibilidade que os trabalhadores davam, sempre andando aceleradamente no trabalho, quase correndo. Uma exceção a essa regra eram os trabalhadores de repartições públicas, como aqui faziam com má vontade e desleixo. Estou falando da indústria. Outras pistas que confirmam o meu sentimento sobre o assunto, a paixão com que o professor Estefano explicava sobre seu trabalho no chão de fábrica, tentando nos passar a importância de ter cuidado com as ferramentas da indústria. Ele nos disse, logo no primeiro dia, que aproximadamente 90% das empresas lá eram de origem familiar, a família construiu seu negócio estendendo seu meio de relacionamento. Conan e seu Jorge sempre comentavam o cuidado que seus chefes tinham com a coisa privada, admirava os passos firmes e rápidos que seu gerente de fábrica dava o dia inteiro, sempre de pé, nunca fazia corpo mole. Era uma disciplina quase militar. Pelas ruas dava para sentir a obsessão deles pelo trabalho, o contraste é gritante. O trabalho é para eles um dogma, um fim e não um meio de conseguir as coisas...

Almoço. Como sempre minha maçã. Dessa vez lendo a apostila de italiano. Eu já estava captando a rotina do meu canto de repouso, reconhecia muitas pessoas, os mesmos cães passeando, os mesmos casais namorando, a mesma paisagem. Eu tenho um problema grave com a rotina, ainda bem que o final de semana estava chegando.

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