quarta-feira, 1 de novembro de 2006

53 –Uma pausa boliviana.




Aquele dia foi uma das poucas vezes que eu tinha visto David de fogo, mesmo assim ele não perdia aquele sorriso característico que tinha. Durante a noite, mais bagunça, dessa vez houve algo diferente. Escutava a voz de um rapaz, jovem, rindo. Uma risada característica das pessoas portadoras de retardamento mental, e mais baixo um pouco ouvia outras pessoas da casa que acompanhavam essa risada, entre elas Mercedes e consegui distinguir também a voz de Sanchez. Entre as gargalhadas eles conversavam, senti certa tensão naquilo. O rapaz falava:

– Dããããã... Vocês não sabem do que sou capaz... – E riam.

– Não duvidem de mim... – E riam.

– ... vocês querem ver? – E riam.

Primeiro ele ria, seguido de Mercedes e logo os demais acompanhavam eles, sempre seguindo este padrão. Dava a impressão de que não queriam contrariá-lo. Deixei pra lá e tentei voltar a dormir, mesmo preocupado de que poderia ser alguém perigoso e sobraria para a gente lá em cima. Finalmente consegui dormir. No outro dia sou despertado com a voz de Maria, em um tom de voz que nunca imaginei nela.

– Fredy? Acorda. Você não é bem vindo nessa casa. Depois de tudo o que aprontou como tem coragem de aparecer aqui?

Mmmmm... nhãnhã... – Ele ficava resmungando jocosamente.

– Você pensa que não sabemos que foi você quem quebrou o vidro do carro para roubar as cervejas de meu esposo? Nós sempre te recebemos bem, mas não podemos confiar em você mais, mesmo sendo filho de Marina. Ande. Vá embora daqui. Antes que meu marido chegue e aí sim vai haver um problema bem grande aqui.

Então ela se retirou e Fredy logo em seguida foi também. Mais uma vez Mercedes não estava na cama, mais uma vez não percebi nada a noite inteira, mais uma vez... Todos se despertaram aí David me convidou para sairmos até a feira para comprar uns quitutes bolivianos que lá vendiam. A feira funcionava naquele estacionamento suspeito que quase entrei em pânico quando estive com Marcos. O salgado, que se chamava Saltena, era até gostoso, tinha um recheio com frango, para variar, e legumes. Tudo o que os bolivianos fazem tinha que ter frango, acredito que aquele seja o prato principal deles, o pior é que nunca me acostumei com o tempero deles. Ou seria melhor dizer a falta de tempero deles? Lá conversamos com alguns conhecidos de David. Quando estávamos voltando passou uma Ferrari rugindo do nosso lado, David ficou fascinado, eufórico. Dei um tempo na casa conversando com o pessoal, naquela altura Jorge já tinha chegado e estava comentando sobre Fredy, ele estava bravo. Brinquei com as crianças para praticar um pouco mais de italiano com elas e então parti de volta para a casa de Elizabeth, dessa vez era mais tarde. Quando cheguei, ela estava terminando de preparar o almoço. O sobrinho dela, filho de Federico estava lá, um garoto da mesma idade do meu filho, ele teve que interromper os estudos

por causa de sua ida à Itália, elas estavam se queixando de que ele era muito agitado, mas me pareceu educado. Lembrou-me muito de meu filho. Quando terminamos, fui com Elizabeth a uma casa de telefone que tinha ali perto para ela ligar para a Colômbia. De lá saímos para dar uma volta pela cidade, foi quando ela se lembrou da casa de Margaret e que Pilar tinha dito a ela que iria para lá mais tarde. Resolvemos ir, o problema era que Elizabeth só andava de ônibus e eu não, ela não gostava muito de caminhar, mas não teve outro jeito fomos a pé. Até hoje não consigo entender como fui me dar tão bem assim com minha amiga, nós éramos exatamente o oposto um do outro e ela tinha uma característica q

ue me incomoda nas pessoas, era muito nervosa, ficava brava por qualquer coisa, só que com ela eu não ligava, eu conseguia entender seu jeito.

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