segunda-feira, 4 de setembro de 2006

6 – Modelo matemático.

Como eu já tinha dito, o contato com as pessoas e a abordagem do assunto por parte delas sobre a minha intenção foi muito importante para uma construção de um possível cenário que eu iria encontrar na Itália, muitos problemas que eram óbvios e sabia que existia eu não conseguia ver com a devida gravidade que era exigida, como, por exemplo, em uma ocasião que o meu tio Adalberto abordou na casa de meus pais, começou assim:
– Fabriciu, você está pensando em ir quando para a Itália?
Como assim? Ele não está acompanhando os meus problemas? Não dá para ver que é assim que der? Pensei comigo. Mas em todo caso respondi:
– Assim que eu conseguir arrumar todos os papéis.
– E você conhece alguém na Itália que irá te receber?
Quando olhei percebi que minha mãe estava ligada e já pensei. – Tão querendo armar um complô para fazer com que eu desista, vão me indagar com um monte de perguntas que já sabem a resposta. – Naquela altura eu já estava começando a ficar irritado com a demora dos papéis e estava ficando sensível, ainda bem que mantive a calma.
– Ainda não. – Respondi rapidamente para tentar demonstrar desconforto sobre o assunto.
– Mas e como você vai fazer para se arrumar lá, nem o idioma você sabe!
– Pronto agora minha mãe vai aproveitar o gancho para falar um monte no meu ouvido também. – Pois é tio, mas eu não vejo problema nenhum nisso afinal não é a primeira vez que eu parto para um país estrangeiro com idioma diferente. – Estava me referindo ao intercâmbio cultural que fiz por intermédio do Rotary Club no México em 1992 onde fiquei morando lá por um ano. Minha mãe não disse nada, só ficou ouvindo.
– Mas lá você estava indo com um destino certo com pessoas que ficariam responsáveis por você.
– Então, isso vai ser compensado com minha experiência que adquiri até aqui, naquela época eu tinha tudo certo, mas era muito novo, um adolescente, e o desafio era até maior do que hoje em termos de proporções e a experiência que ganhei lá será somada.
– Mas o italiano não é igual ao espanhol que todo mundo entende e os mexicanos fazem parte do continente americano, são um povo muito parecido com a gente, muito diferente dos italianos que são europeus e muito frios, acho que não custa você procurar alguém que mora lá para ver se eles podem te receber, você tem o filho da prima do seu pai, a Vera, que esteve lá e conheceu os parentes italianos da sua família, porque você não procura ele? Tem o Carlos Budrini, amigo do seu pai, o filho dele mora lá também, tem o seu Begnozzi aqui tem o telefone dele. – Nossa! Ele não tentou me fazer desistir da idéia de partir para a Itália! E as idéias dele parecem interessantes, afinal não custa nada tentar, se a gente pode facilitar as coisas é melhor, embora ir na raça sem ninguém esperando me soa mais épico, mais romântico.
– Eu conheci uma senhora no consulado italiano, a Ofélia, ela me ofereceu ajuda também, me pareceu bem sincera, eu tenho o e-mail e telefone dela, ela mora lá e está aqui para vender um apartamento da família dela. Vou escrever para ela mais para frente assim que sair os papéis.
– Tem mais, você tem que aprender italiano. Faz um curso, pelo menos uma noção você tinha que adquirir, nas bancas de jornal sempre tem esses cursos para vender.
Legal, a conversa foi importante, depois eu percebi isso. É como eu já disse, chega uma hora que a gente fica sensível a qualquer coisinha e é mais fácil de se irritar à toa e na esmagadora maioria das vezes a gente está desperdiçando uma oportunidade de acrescentar algo de importante. Nessas horas é bom para aprender que não custa ouvir, afinal se a sua idéia for boa ela pode ser sustentada com argumentos, porque se você não tiver argumentos então é uma furada, é melhor mudar os planos, agora se você tiver argumentos mas ainda houver lacunas a preencher um bom debate vai ajudar muito.
Fiz o que meu tio sugeriu, procurei o seu Carlos e foi um desastre, ele me disse um monte de coisas que não faziam sentido para mim, talvez a gente estivesse falando sobre assuntos diferentes, o fato é que achei melhor deixar para lá e buscar o próxima da lista o filho da prima do meu pai, fui na loja dele de celulares umas quatro vezes em dias diferentes e nunca encontrava ele, deixava recado sobre o assunto que eu queria tratar e ele nunca me respondeu, também não o conhecia apesar de sermos parentes distantes. No caso de aprender italiano eu achei que não compensava comprar nenhum curso, pois sempre estava contando com minha partida para a próxima semana, a minha esposa encontrou naquele projeto do governo das escolas funcionarem nos finais de semana um curso de italiano e adivinhe só, o professor era o seu Begnozzi, italiano radicado no Brasil, um senhor muito atencioso, de imediato me disse que não tinha muito no que me ajudar porque fazia tempo que ele não voltava para a Itália, mas me passou o e-mail do seu sobrinho que mora lá e disse que era uma pessoa muito legal. Tive algumas aulas de italiano com o seu Begnozzi na escola só que ele faltava muito. Tudo bem, enviei uma mensagem para o sobrinho dele em italiano, demorei um dia inteiro para bolar a mensagem, no final o sobrinho dele me respondeu dizendo que morava em um apartamento muito pequeno sem condições de receber alguém, ele morava com a esposa e mais dois filhos, terminou a mensagem me desejando boa sorte e mandando lembranças para o tio. Pelo menos respondeu à minha mensagem. Claro que não esperava grandes coisas, tentei mais para depois não disserem que não dou ouvidos a ninguém. Para a Ofélia eu escrevi uma semana antes de partir, mas só recebi o retorno quando já estava na Itália, tarde demais.

À medida que o tempo ia passando eu bolava meu plano de ataque contra a Itália, involuntariamente, como num hábito de engenheiro, eu criava um modelo matemático adicionando as variáveis e fazendo simulações tentando prever a pior situação, uma coisa que todo engenheiro é obrigado a saber mas se esquece é que a gente deve superestimar as piores situações e mesmo assim não será suficiente. Muitas lacunas foram preenchidas com as conversas que ia tendo com as pessoas, o do meu tio mesmo me abriu os olhos, me colocou mais próximo da realidade que eu iria encontrar, deu uma chacoalhada. Estava pensando mais no lado romântico da coisa esquecendo da realidade cruel que fazemos parte. Havia questões sobre o meu filho, a minha esposa durante esse período que estaríamos separados, mas tem aquele velho mal hábito de criar um modelo e segui-lo como se não houvesse imprevistos, como se a gente pudesse manter as coisas sob controle.

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